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Recondução de Gonet mostra complacência do Senado com inércia da PGR diante dos atos de 8 de Janeiro

Gonet participa de sabatina na CCJ do Senado — Foto: Geraldo Magela/Agência Senado

Por Celso Alonso – Brasília, 12 de novembro de 2025

A decisão do Senado Federal de reconduzir Paulo Gonet ao comando da Procuradoria-Geral da República (PGR) por mais dois anos reacende o debate sobre a falta de firmeza institucional diante dos desafios impostos à democracia brasileira desde os ataques de 8 de janeiro de 2023. Com 45 votos favoráveis e 26 contrários, o plenário confirmou o nome indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, após a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) aprovar o parecer por 17 votos a 10.

Mas o resultado, longe de representar estabilidade, revela um preocupante pacto de conveniência entre Senado e Ministério Público. A recondução de Gonet, marcada por um discurso protocolar de “neutralidade técnica”, parece ignorar o descompasso entre a gravidade dos ataques às instituições e a morosidade da PGR em promover responsabilizações amplas e transparentes.

Um Ministério Público sem voz firme

Durante a sabatina, Gonet reafirmou que a Procuradoria “não apresenta denúncias precipitadas” e “não busca aplausos”. No entanto, o tom sereno do procurador contrasta com a timidez da PGR em casos sensíveis envolvendo autoridades e financiadores dos atos antidemocráticos. Desde o início de sua gestão, o órgão tem adotado uma postura de reserva excessiva, em nome de uma suposta imparcialidade que, na prática, beira a omissão.

A condução dos processos relativos ao 8 de janeiro tornou-se símbolo dessa ambiguidade institucional. Embora a PGR tenha participado das denúncias contra executores e apoiadores diretos da tentativa de golpe, as investigações sobre mandantes e articuladores políticos seguem lentas, e a falta de transparência sobre as linhas de apuração reforça o sentimento de seletividade.

CCJ: sabatina sem rigor, aprovação previsível

A sessão da CCJ, presidida por Otto Alencar (PSD-BA), foi marcada mais por cordialidade do que por questionamentos substantivos. Salvo raras exceções, como os embates com o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), prevaleceu o tom morno, com perguntas superficiais e respostas evasivas.

Ao tratar dos atos golpistas, Gonet repetiu que a PGR “não criminaliza a política” e que suas manifestações foram “validadas pelo Judiciário”. A fala, embora juridicamente correta, revela uma visão burocrática de um cargo que exige postura republicana e independência efetiva, não apenas formal.

Para uma comissão que se autoproclama guardiã da Constituição, a CCJ se mostrou pouco disposta a confrontar o procurador-geral sobre a responsabilidade institucional da PGR em garantir que os ataques de 8 de janeiro não fiquem sem plena resposta.

Plenário dividido, mas complacente

No plenário, o placar de 45 a 26 expôs uma divisão política, mas não um debate de fundo. Os votos contrários vieram majoritariamente da oposição, em tom de retaliação, e não por convicção sobre a necessidade de uma PGR mais proativa. Já os favoráveis preferiram o discurso da “estabilidade” e da “autonomia do Ministério Público”, argumentos que mascaram a falta de cobrança real sobre a efetividade das ações da Procuradoria.

Ao reconduzir Paulo Gonet sem questionar sua lentidão em temas cruciais, o Senado perdeu a oportunidade de reafirmar a independência republicana frente a um Ministério Público que parece mais interessado em evitar ruídos do que em enfrentar os fantasmas da ruptura democrática.

Uma recondução sem autocrítica

A aprovação desta quarta-feira deixa clara uma contradição: o Senado, que foi alvo direto dos ataques de 8 de janeiro, optou por recompensar a inércia de um procurador que pouco contribuiu para a reconstrução da confiança institucional.

Em um país onde a estabilidade democrática ainda depende da vigilância das instituições, a recondução de Gonet à PGR simboliza não a continuidade do equilíbrio, mas a persistência do silêncio institucional diante da violência política.

Enquanto o Senado aplaude a “moderação”, a sociedade segue à espera de um Ministério Público verdadeiramente comprometido com a verdade e com a justiça , não apenas com a liturgia do cargo.

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