Por Celso Alonso
Hugo Barreto/Metrópoles
A nova ofensiva da oposição no Senado reacendeu o debate jurídico em torno das condenações relacionadas aos eventos de 8 de Janeiro. Parlamentares apostam agora em um argumento técnico consolidado no Direito Penal brasileiro: a abolitio criminis, mecanismo que extingue crimes quando o Congresso revoga tipos penais anteriormente previstos em lei. A leitura apresentada pelos senadores sustenta que essa mudança teria efeito imediato e alcançaria todos os réus condenados com base nesses dispositivos — incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro.
O ponto de partida da estratégia é o projeto apresentado pelo senador Carlos Viana (Podemos), que propõe a revogação de artigos do capítulo de Crimes contra o Estado Democrático de Direito, considerado pela oposição como excessivamente aberto, impreciso e suscetível a interpretações que extrapolam limites tradicionais do Direito Penal. A proposta não é inédita, mas a ênfase agora está no impacto jurídico automático da medida.
Líder da oposição, o senador Rogério Marinho (PL) destaca que a revogação dos dispositivos acionaria um princípio fundamental do ordenamento jurídico brasileiro: “Quando o Congresso deixa de considerar uma conduta criminosa, ela automaticamente deixa de gerar efeitos penais. Isso anula a execução da pena, remove os antecedentes e extingue a condenação, mesmo que já haja trânsito em julgado.”
A análise reforça a expectativa da oposição de que a alteração legislativa possa corrigir o que parlamentares classificam como desequilíbrios e excessos nos enquadramentos jurídicos adotados nos últimos anos.
O senador Carlos Viana, autor da proposta, afirma que a Constituição é clara ao determinar a retroatividade da lei penal mais benéfica ao réu.
“Quando um crime é revogado, ninguém pode ser punido por ele. Essa regra protege qualquer cidadão e impede que condenações permaneçam baseadas em dispositivos frágeis, vagos ou abusivamente interpretados.”
Para ele, o impacto seria amplo e impessoal: “A revogação dos tipos penais beneficia Jair Bolsonaro da mesma forma que qualquer outro brasileiro enquadrado nesses artigos. Não estamos falando de um nome específico, mas do restabelecimento da lógica jurídica e da proteção contra arbitrariedades.”
A proposta tem encontrado ressonância em setores que defendem revisão profunda da legislação aprovada nos últimos anos, argumentando que determinados dispositivos abriram espaço para decisões judiciais pautadas em critérios pouco objetivos. Para esses grupos, o avanço do projeto simbolizaria não apenas a possibilidade de revisão de condenações, mas também um passo para restaurar previsibilidade, equilíbrio e clareza no sistema penal brasileiro.
Enquanto Bolsonaro permanece preso na carceragem da Polícia Federal, condenado a 27 anos de prisão por tentativa de golpe de Estado, a oposição trabalha para acelerar o debate no Congresso. O tema deve mobilizar intensamente as próximas semanas, colocando em discussão os limites da legislação penal, o alcance da retroatividade benéfica e o papel do Parlamento na definição do que o país entende como crime.
